Foto Pedro Lima - Unsplash
Roma (NEV), 16 de fevereiro de 2023 – Homens violentos sĂŁo encontrados, em todos os setores, em todas as esferas da vida, em todo o mundo e em todas as religiões. Como defender os direitos de cidadania de toda mulher? Em nosso paĂs, apesar dos novos instrumentos legais contra a violĂŞncia (com o chamado "cĂłdigo vermelho"), os abusos e violĂŞncias contra as mulheres, tanto italianas quanto de outras nacionalidades, estĂŁo aumentando. Isso foi discutido na conferĂŞncia "ViolĂŞncia de gĂŞnero e religiões: desafios locais" promovida pelo ComitĂŞ Nacional da Federação das Mulheres EvangĂ©licas da Itália (FDEI), realizada em Brescia há alguns dias.
Perguntamos a um dos palestrantes como foi, Madalena Colomboprofessor de sociologia dos processos culturais e comunicativos na Universidade Católica do Sagrado Coração de Brescia, além de presidente da Associação Dòsti - Festival de artes e culturas religiosas e diretor do Centro de iniciativas e pesquisas sobre migração - Brescia (CIRMIB ), na mesma universidade.
Como Dosti nasceu?
Dòsti nasceu, como associação, em 2019, mas como projeto em 2016, quando o entĂŁo Prefeito de Brescia ValĂ©rio Valenti exortou todas as associações, universidades e municĂpios da regiĂŁo a promover o diálogo inter-religioso. O Valenti garantiu uma reuniĂŁo inicial e depois, de baixo para cima, montamos o projeto. Depois de alguns encontros informais, nasceu esta fĂłrmula de diálogo entre linguagens artĂsticas: mĂşsica, poesia, pintura, escultura, teatro, vĂdeo-arte, digital. Agregamos tudo em torno dessa ideia de momento de exposição. Depois de um ano, aconteceu a primeira edição do Festival.
PorquĂŞ “Dòsti”, com este Ă’ que parece acentuar um cĂrculo de cores, uma espĂ©cie de anel que une a diversidade?
Dòsti em urdu significa amizade e fraternidade. Urdu Ă© uma lĂngua significativa para Brescia, porque Ă© um destino de emigração para muitas pessoas da ĂŤndia e do PaquistĂŁo. Nesses paĂses, o panorama religioso tambĂ©m inclui sikhs e hindus. Dòsti tambĂ©m coleciona experiĂŞncias e pessoas que representam o cristianismo, o judaĂsmo, o islamismo, o budismo... Todos gostaram da palavra, por ser facilmente pronunciável e direta, entĂŁo a Accademia Santa Giulia criou o logotipo, com o O acentuado (um acento que em urdu na verdade nĂŁo há).
Violência de gênero e religiões. Uma combinação que nos faz pensar em nós que voltam para o poleiro. Como desamarrá-los? Como podemos falar sobre este tema?
Nunca se faz o suficiente sobre a violĂŞncia de gĂŞnero. Por isso colaboramos para declinar o tema a partir de diferentes abordagens: teolĂłgica, sociolĂłgica, a das experiĂŞncias diretas de um mediador cultural de lĂngua árabe e islâmica. E pela voz de quem atende pedidos de ajuda, com o nĂşmero de emergĂŞncia contra a violĂŞncia de gĂŞnero 1522.
Temos procurado fazer com que as pessoas entendam a dupla face da religiĂŁo, tanto na histĂłria quanto nos dias atuais. As religiões sĂŁo porta-vozes de uma visĂŁo machista decorrente do domĂnio do patriarcado como forma de inferiorizar as mulheres por serem submetidas a uma ordem de homens idosos. Mesmo uma mulher idosa nunca tem o mesmo poder que um homem dentro de um grupo, comunidade ou famĂlia, com raras exceções.
As religiões são machistas?
As religiões se desenvolveram dessa forma, e assim contribuem para uma visão machista da sociedade em que as pessoas não se relacionam como são (com suas habilidades, personalidades, personagens, história, origens, crenças e ideias), mas de acordo com seu gênero. O que resta é uma visão agora historicizada de uma mulher incapaz de mudar o mundo, simplesmente a serviço do homem e da estrutura social.
No meu relatĂłrio, ao apresentar este ponto de partida, tentei, no entanto, sublinhar que nenhuma religiĂŁo autoriza ou legitima a violĂŞncia contra as mulheres. Todos eles, em seus textos sagrados, engrandecem a mulher como portadora de vida e generatividade, sĂł para dar um exemplo.
EntĂŁo Ă© possĂvel distanciar-se de um uso cultural de opressĂŁo e exploração da religiĂŁo para fins machistas?
Sim. É preciso recuperar aquela função da religiĂŁo que, precisamente hoje, poderia ser salvĂfica. AtravĂ©s de redes de solidariedade nas comunidades, tambĂ©m em chave inter-religiosa. Este Ă© o outro lado da religiĂŁo, e Ă© o que pode ajudar as mulheres a sair das condições de escravidĂŁo, inferioridade e violĂŞncia.
VocĂŞ trouxe testemunhos de sobreviventes da violĂŞncia. Qual Ă© a utilidade de compartilhar sua histĂłria?
O que as mulheres sofrem, aqui ou no mundo dos imigrantes, diz respeito a todos. Pensemos no caso da menina convencida por um homem que se autoproclamava referente de sua igreja pentecostal: levada para a Itália com promessa de emprego, enganada, escrava sexual, torturada durante a viagem e abusada na chegada, chantageada pagar a dĂvida tambĂ©m por meio de uma mistura de elementos "animistas" (disseram-lhe que para afastar o mal ela teria que usar seu corpo como seus algozes queriam e diziam). Essa menina consegue se distanciar, antes de tudo dizendo para si mesma: "NĂŁo acredito em um deus que me faz ter isso". Ela se encontra na rua das Ursulinas da comunidade de Ruth, negando um deus ela reencontra outro Deus em um ambiente de salvação e acolhimento, em um abrigo.
Para combater a violĂŞncia contra a mulher, a religiĂŁo pode (deve) ser um refĂşgio?
Acho que as religiões teriam todas as oportunidades para fazer isso, nĂŁo apenas para criar um espaço seguro para todos e para as mulheres, mas tambĂ©m em um sentido mais Ăntimo e profundo. NĂŁo pode ser "deus" quem diz ao homem "bate na tua mulher". Pensemos tambĂ©m na notĂcia de Saman Abbas morreu seguindo a vontade de suprimi-lo por homens da famĂlia, tio e irmĂŁos. Um desses homens aparece como uma festa civil e permite que parte da histĂłria seja reconstruĂda, para encontrar seu corpo. Isso nos faz entender a diferença entre preceito religioso e abuso cultural por comportamentos julgados inadequados. Isso nos faz entender o que significa a violação da liberdade. Para entender, devemos nos apegar a episĂłdios reais e concretos de violĂŞncia no mundo religioso. Está em toda parte, no Cristianismo como no IslĂŁ como em qualquer outro lugar.
Que alianças vocĂŞ vĂŞ como possĂveis para finalmente sair das espirais da violĂŞncia?
Precisamos de uma reforma dentro das religiões. E é necessária uma ponte entre as religiões, para o reconhecimento universal do direito e da liberdade de professar uma religião ou não, e como professá-la. Fiquei muito impressionado com o testemunho do relator afegão, Batool Haidari, ativista de direitos humanos, ouvimos dela o que significa sofrer violência e limitação da liberdade pessoal. E o que significa tentar se libertar. Em continuidade com outros setores da ação e do pensamento humano, a religião deve se reformar e oferecer aos homens uma mensagem de liberdade e salvação. Como presidente de uma associação comprometida com essas questões, sinto dizer que não quero fazer pesquisa, mas agir. É por isso que me sinto honrada em participar junto com outras mulheres e homens de todas as religiões na criação de algo novo.
PrĂłximos eventos?
Graças também aos fundos Otto per mille da Igreja Valdense - União das Igrejas Metodistas Valdenses, estamos organizando nosso próximo Festival, o primeiro na presença do pós-pandemia, no contexto das capitais da cultura Brescia-Bergamo. Esperamos por si de 6 a 13 de maio sob o tema "morrer e renascer". Um ciclo que sempre uniu gerações, origens, territórios e religiões.
A conferência também foi moderada pelo pastor da Igreja Valdense de Brescia Leonardo Magrì: a pastora Gabriela Lio, presidente da FDEI Roma. Naima Daoudagh, Mediadora cultural em serviços de saúde. Viviana Cassini, Presidente da Associação Casa da Mulher-Centro Antiviolência, Brescia. Batool Haidari, Universidade de Cabul, ativista dos direitos das mulheres.
Os três primeiros festivais Dòsti foram: “Religião como relação social – Os sons da alma”, em 2017. “Festas religiosas: rito, som, cor” em 2018. “A respiração da Terra: religiões e meio ambiente no comunidade local", em 2019. Com a pandemia veio "Radio Dòsti": música, histórias, contos de fadas, discussões sobre arte, espiritualidade e religiões em podcasts.
CĂ“DIGO VERMELHO
O cĂłdigo vermelho (Lei 69/19) acelerou algumas medidas de proteção Ă s vĂtimas de violĂŞncia e introduziu novos crimes. TambĂ©m reforçou várias sanções e introduziu circunstâncias agravantes.
De crime de divulgação ilĂcita de imagens ou vĂdeos sexualmente explĂcitos sem consentimento das pessoas representadas (a chamada “pornografia de vingança”), com pena de prisĂŁo de 1 a 6 anos e multa de 5.000 a 15.000 euros.
Para o crime desgraçado, que prevê a pena de prisão de 8 a 14 anos, cuja pena implica ainda a inabilitação perpétua para os cargos de tutela, tutela e administração de apoio. Se a desfiguração causar a morte, a pena é prisão perpétua.
Para o compulsão ou indução ao casamento, a pena é de prisão de 1 a 5 anos, agravada quando o crime for cometido em detrimento de menores. Proceder mesmo que o delito seja cometido no exterior por ou em detrimento de cidadão italiano ou estrangeiro residente na Itália.
Para o violação das disposições relativas ao afastamento do domicĂlio familiar e Ă proibição de aproximação aos locais frequentados pelo ofendidodetenção varia de 6 meses a 3 anos.
O perseguindo é punido com pena de prisão até 6 anos e 6 meses.
Para o agressão sexual: reclusão de 6 a 12 anos, com várias agravantes que podem levar à reclusão de até 24 anos de prisão. A violência sexual em grupo é punida com pena de prisão de 8 a 14 anos.
O abuso de familiares e coabitantes sĂŁo punidos com pena de prisĂŁo de 3 a 7 anos; em caso de lesões graves ou gravĂssimas, as penas aumentam, atĂ© 15 anos, e duplicam em caso de morte. AlĂ©m disso, a pena Ă© aumentada de metade se o crime for cometido na presença ou em detrimento de menor, grávida ou deficiente.
O homicĂdio agravado por relações pessoais Ă© punido com prisĂŁo perpĂ©tua, ainda que se trate de relação afetiva sem uniĂŁo estável ou de uniĂŁo estável nĂŁo caracterizada por relação afetiva.
AlĂ©m disso, para alguns crimes, por exemplo violĂŞncia sexual, a vĂtima pode apresentar queixa atĂ© 12 meses apĂłs o fato. Para crimes sexuais, a suspensĂŁo condicional da pena está condicionada Ă participação em cursos de recuperação. Por fim, a legislação prevĂŞ cursos profissionalizantes especĂficos para as forças de ordem, para prevenção e avaliação do risco de reincidĂŞncia.
...
Ler artigo
Deixe o seu comentário! Os comentários não serão disponibilizados publicamente